sábado, 2 de janeiro de 2010

O dia da Matança ou "Mata-porco"


Era  normalmente entre o Natal e o Ano Novo que decorriam as matanças, aproveitando o frio e as geadas para decorrer e enrigecer as carnes. Os porcos eram cevados em casa com castanhas, folhas de negrilho, beterrabos, bóbdas (abóboras) grão e ferrã e, muitas vezes, tinham mais de 200kg.
Nesses tempos a carne de porco era a base de toda a alimentação, quer nas carnes frescas, quer nas carnes salgadas e fumadas, quer nos enchidos, tudo se aproveitava e era depois utilizado ao longo do ano. A gastronomia transmontana conserva ainda muitos dos petiscos, confeccionados com carne de porco, com que as nossas mães e avós nos brindavam. Costuma dizer-se que do porco só não se aproveitam as unhas e os ossos, até o sangue é utilizado para fazer os chouriços de verde ou os chavianos (feitos com sangue e carne de adoba).
Além da carne, o porco dava ainda outros produtos de grande utilidade como: o pingo (banha), o unto, o toucinho e os rijões (torresmos) que se conservavam ao longo do ano e permitiam temperar o caldo, untar as torradas de centeio e rijar (fritar) as batatas. Os rijões também podiam ser comidos com pão ao mata-bicho.

As matanças eram como rituais para os quais se convidavam os familiares e amigos mais chegados. Nesse ritual, em que os porcos eram sacrificados, o matador devia sangrar bem o animal sem lhe prolongar o sofrimento. Por isso, nem todos gostavam dessa tarefa que ficava normalmente a cargo dos mais velhos e experientes. Aos mais novos era reservada a tarefa de apanhar o bicho, segurá-lo e ajudar depois a prepará-lo, isto é, chamuscar-lhe o  pelo, lavá-lo e rapá-lo. Por vezes o dono do porco dizia "... rapem bem o pelo que a patroa já vê mal..."
O mais novo era incumbido de cortar o rabo e assá-lo com muita malagueta para depois todos beberem mais um copo de vinho. Aos garotos estavam também reservadas algumas partidas que os mais velhos estavam sempre prontos a pregar. Meter as unhas do porco no bolso, pendurar a vergalheira nas costas ou levar com a gola na cara eram algumas das brincadeiras mais frequentes.
Depois do porco limpo e pendurado na escada eram retiradas as tripas. Cada aldeia tem a sua forma de realizar estas tarefas. Em Gondesende começa-se por retirar a couracha e a barbada ainda no banco mas as tripas só são retiradas depois de o porco estar pendurado numa escada.
O Sobeio que prendia o jugo ao carro das vacas era utilizado para pendurar o porco numa das traves da adega. Depois disto todos os que participaram na matança reuniam-se à mesa para comer os garrochos  (pedaços da barbada junto ao pescoço) e o figado assados nas brasas. As mulheres da casa eram encarregadas da lavagem das tripas e da sua preparação para poderem ser utilizadas nos enchidos.
O dia terminava com um jantar em que normalmente não se servia carne de porco e a que se seguia um serão de boa conversa e uma suecada.
Actualmente tudo isto são apenas recordações que por vezes alguns, cada vez menos, ainda teimam em avivar.

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