Era domingo e estava uma daquelas manhãs geadeiras do inicio de Dezembro. Desde o Ranhadouro até ao Porral havia uma geada branquinha que parecia neve e a bica dó campo estava cheia de carojo. O primo de Bragança tinha vindo pela manhã com o pai por causa de uns assuntos de que eles pouco entendiam, coisas de homens!... Enquanto todos conversavam à lareira à espera de um chocolate com sopas para o mata bicho que a tia Belmira estava a cozinhar no pote, o Zé pequeno chamou o primo para o cimo das escadas para lhe contar que a Castanha tinha parido um vitelinho há cerca de uma semana. É mesmo bonito, dizia ele, farta-se de mamar e já salta como um cabrito. Está uma autentica fera!.. rematou para acicatar a curiosidade do primo. Vamos lá vê-lo enquanto eles estão entretidos na conversa, dizia o Zé. O vitelo está na loja dó Pácio e o tio Tó Pedro já deitou as vacas para o lameiro. E assim foi, a correr pelo caminho acima com as botas a bater na côdea dura em que a geada tinha transformado o lodo, lá foram lampeiros que a curiosidade era muita e dificil de aguentar.
De facto, o bicho era mesmo bonito e já se mexia bem. Assustado, correu para o fundo da loja logo que os primos puxaram o caravelho e abriram a porta. E lá ficou, encostado à parede coberta de teias de aranha e a olhar paras os ganapos como que a perguntar, quem são estes? e o que é que eles querem? Quanto a eles, estavam entusiasmados com a ideia de terem o bicho ali indefeso e à sua mercê. O Zé pequeno, mais velho e mais habituado às lides do campo, propôs logo que se lhe fizesse a pega. Não de cernelha, que isso é coisa de fracotes, mas sim uma pega de caras, como deve ser, como fazem os forcados. E assim foi, aproximaram-se encostados à parede procurando por os pés na palha mais seca, pois a loja, que não estava estrumada de novo, mais parecia um esterqueiro. Quando já estavam ambos com o touro alinhado e pronto para a pega, o bicho assustado investiu contra eles atirando-os de costas para cima da bosta fresca.
A queda foi amparada na camada mole que revestia o chão da loja e não deixou lesões, o pior foi depois explicar ao pai e aos tios como tinha acontecido, o que tinham feito para ficar todos cagados. A conversa sobre um ter escorregado no gelo do caminho e cairem ambos no lodo quando o outro, puxando o braço procurou ajudar pareceu não ter sido muito convincente, no entanto evitou males maiores!..Quanto aos dois lafraus pouco aprenderam com a lição pois muitas partidas e brincadeiras haviam ainda de partilhar, não com aquele vitelo que não tinha revelado grande gosto por brincadeiras.
Mário Vaz-Porto
O Anibal, o Zé pequeno e o tio César na companhia de um visitante que estava em Portela |
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